O episódio envolvendo a mulher adúltera, levada até Jesus (Jo 8,1-11) manifesta a sabedoria e a misericórdia do Redentor. Todos os pormenores deste fato merecem total atenção. Ao romper da manhã, do monte das Oliveiras Cristo voltou ao templo e o povo se reuniu em derredor dele para O escutar. Era então um momento propício para que os escribas e fariseus O surpreendessem com uma questão complexa e, na verdade, bem dramatizada pois traziam consigo uma mulher surpreendida em pecado.
Pela lei de Moisés ela deveria ser lapidada e Jesus que diria Ele? Dilema insolúvel segundo seus inimigos. Com efeito, se Ele a desculpasse estaria indo contra a lei mosaica e poderiam então o acusar; se ele confirmasse o suplício da lapidação, onde estaria Sua misericórdia? Ele sacrificaria a Lei (Dt 17,5) ou a pobre mulher que estava diante dele? Jesus que não viera abolir a Lei, mas a aperfeiçoar, como ele mesmo afirmara (Mt 5,17) se põe a escrever no chão. Qual o significado deste gesto? A Lei da Antiga Aliança fora escrita na tábua de pedra entregue a Moisés, Cristo, porém, escreveria a Lei da Nova Aliança no ser humano.
Assim como a vida germina da terra, a Nova Lei iria germinar no coração das pessoas. Ele ensinaria como penetrar fundo no significado do preceito divino, passando do perfeito conhecimento à autêntica prática do mesmo. Por isto significativo foi também a hora em que os escribas e fariseus entraram em diálogo malicioso com ele. O fato se dá na aurora de um novo dia que raiava e, na verdade, no templo de Jerusalém. Não são detalhes inúteis. Estavam no período antes do nascer do Sol, quando este já ilumina a parte da superfície terrestre a tirando da sombra.
É o instante do claro-escuro. A luz não está ainda completamente sobre a terra, mas as trevas vão se diluindo. O papel que Jesus viera exercer neste mundo era exatamente este de revelar a luz no seu esplendor, dissipando toda e qualquer sombra. Eis por que a solução que Ele dá ao caso é simplesmente luminosa. Diante dele estavam manipuladores da lei que manipulavam as pessoas.
Queriam hipocritamente uma resposta do Mestre divino que julgam num beco sem saída. Jesus não fala nada, mas faz um gesto, escrevendo no chão. Bem se diz que os gestos falam mais do que as palavras! Seus inimigos não são capazes de decodificar o que Jesus estava a fazer e querem, impertinentemente, uma resposta. Ei-la: “Quem dentre vós estiver sem pecado atire a primeira pedra”.
Ao invés de discutir com as testemunhas que acusavam aquela pobre mulher, ele apela para os virtuosos. Era uma variante nova, ou seja, a virtude no lugar no testemunho rancoroso, odioso. Os fariseus, cuja palavra significa separado, puro, piedoso, acusavam uma pecadora. Eles se esqueceram o que está no salmo: “Se tiverdes em conta nossos pecados, Senhor, Senhor, quem poderá subsistir diante de vós?” (Sl 129,3). Naquele instante os acusadores, de juízes, se tornam então os que deveriam ser julgados. A perspicácia de Cristo é notável. Ele os conhecia muito bem. Eles estavam ali para O provocar.
Eram amantes das discussões teóricas, dos debates especulativos, mas não cumpridores da lei. Então a começar dos mais velhos todos foram se retirando. Os biblistas dão várias explicações para esta atitude dos acusadores da adúltera. Santo Ambrósio assim se expressou: “Talvez porque eram eles os mais culpados, talvez porque tendo mais experiência, eles compreenderam melhor a profundidade daquelas palavras e, envergonhados, se puseram a lamentar seus erros”.
Eles se foram e, face a face, ficaram a miséria e a misericórdia. Jesus diz à pecadora: “Eu também não te condeno”. Como pedagogo Ele acrescenta: “Podes ir, e de agora em diante não peques mais”. Ao pronunciar estas palavras Jesus condena o pecado, mas não a pecadora que fica absolvida e que levaria consigo a diretriz que, através dos tempos, ele está a repetir a todo pecador arrependido: “Não tornes a pecar”! Ele não condenou porque era o Salvador, mas não inocentou o pecado, pois este não deveria ser mais praticado. Admiremos então Jesus sábio e misericordioso, mas recolhamos sua sábia advertência.