Lições da transfiguração do Senhor

Todos os detalhes do fato da transfiguração de Jesus narrados por São Mateus (Mt 17,1-9) fornecem elementos para uma reflexão profunda. Os discípulos são conduzidos pelo Mestre divino a uma alta montanha.

Isto mostra que, para se atingir a luminosidade da Transfiguração, as ascensões árduas da ascese são necessárias e cumpre fugir do bulício do mundo e se recolher no silêncio do próprio coração. Deus amadurece seus desígnios na paz interior. A Moisés e a Elias Ele apareceu no monte Sinai. A maneira misteriosa com que se manifesta a presença da divindade mostra bem a espiritualidade do Ser divino que se apresenta à inteligência de personagens por Ele escolhidos, inteligências humanas vinculadas aos sentidos.

No Tabor o aspecto habitual de Jesus se modificou. Sua face resplandeceu como o sol e suas vestimentas se mostraram com uma brancura fulgurante. Nisto consistiu o estado glorioso em que apareceu Cristo aos apóstolos Pedro, Tiago e João. Estes contemplaram um Jesus diferente no seu aspecto de sua vida cotidiana, ali numa forma nova e gloriosa. O que se esquece muitas vezes é que uma experiência semelhante pode se dar na vida do cristão e isto de três maneiras.

Por vezes, a imagem de Cristo se torna aos olhos espirituais da alma tão luminosa e fulgente que seu epígono parece, num instante, tocar o Infinito. A beleza divina de Cristo como que se torna um objeto de inefável experiência. Em outras ocasiões, o coração do batizado percebe de um modo intenso que a luz interior, esta luz dada a todo ser humano para guiar seu pensamento e sua ação, se identifica com a pessoa do divino Redentor e o poder da lei moral se funde com a vontade do próprio Filho de Deus no qual se entrevem o Salvador sacrificado. Ecoa, então, seu apelo para uma observância total do decálogo custe o que custar.

Em outras ocasiões, surge viva a presença de Jesus na figura do próximo, sobretudo, naquele que sofre e padece necessidades. Este homem ou esta mulher se transfiguram vivamente em Jesus Cristo sob o olhar da fé. Disto deve resultar um método preciso de espiritualidade, um método de transfiguração aplicável a todos, em toda parte e sempre.

Para tanto é preciso que o cristão esteja atento aos sinais que o céu lhe envia, captando-os em alta definição. É de notar, além disto, que surgiram no Tabor Moisés e Elias, representantes dos Legisladores e dos Profetas do Antigo Testamento. É que Jesus era a plenitude de toda a revelação divina feita até então e Ele estabeleceria o novo mandamento e combateria a dureza do coração daqueles que renegavam o Pai que está nos céus. Moisés e Elias conversavam com Jesus sobre sua Paixão que se aproximava.

É que na vida de Cristo não se pode nunca separar os mistérios gloriosos como esta da Transfiguração e os mistérios dolorosos de seus sofrimentos. Não se entrará na transfiguração do céu sem aceitar a cruz nesta terra. Era isto que Pedro ignorava, pois queria ficar definitivamente gozando as alegrias daquele instante celestial.

Quantos cristãos só desejam consolações na sua trajetória por este mundo, momentos de doçura íntima nas tertúlias com a Trindade Santa. Neste mundo não se pode degustar uma quietude total que pertence à vida futura. Diz o Evangelista que uma nuvem luminosa envolveu os apóstolos e ouviu-se a voz do Pai como ocorrera no Batismo de Jesus no Jordão: “Este é o meu Filho muito amado, escutai-O”.

Estas palavras dão à cena da Transfiguração todo seu sentido. Cristo não se metamorfoseara para oferecer aos apóstolos um espetáculo impressionante e reconfortante. Sua intenção era traduzir exteriormente o testemunho solene que o Pai rende ao Filho que deveria sempre ser ouvido. Na vida cristã, graça extraordinária não se produz se não houver atenção e obediência à Palavra divina.

Já no Antigo Testamento fora feita a advertência: “Oxalá escutásseis hoje a sua voz: “Não endureçais o vosso coração como em Meribá, como no dia de Massa no deserto, quando me puseram à prova os vossos pais e me provocaram ainda que houvessem visto a minha obra” (Sl 94, 8-9).

É bom refletir sempre neste lembrete de Deus. Os discípulos ficaram aterrorizados, mas Jesus lhes disse: “Levantai-vos e não temais”. Eles levantaram os olhos e não viram mais ninguém senão unicamente Jesus. Isto significa que a condição normal do cristão neste mundo é se ligar à pessoa de Cristo tal como ela é, ou seja, na sua humildade, nos seus sofrimentos, no meio dos menos favorecidos, nos momentos difíceis da vida de cada um.

Cumpre concentrar em Jesus toda a atenção de todo momento, sem se deixar levar pelas atrações meramente terrenas ou pelos apelos dos falsos profetas. Deste modo o cristão se torna um reflexo da presença de Cristo no mundo, levando aqueles que se acham nas trevas a contemplarem a luminosidade do divino Redentor. É por isto que se diz: “Se és um cristão transfigurado unicamente em Cristo, tens o mundo nas mãos”!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *